‘Em Davos, precisou de seis minutos para mostrar sua incompetência administrativa. Com os fuzileiros navais, não precisou de mais de quatro minutos para revelar sua face autoritária e sua ignorância cívica’
Jornal GGN – Intitulado com ‘Quebrando louças’, o editorial de hoje do Estadão não traz boas notícias para o presidente Jair Bolsonaro. Já começa dizendo que um país vai mal quando seu ‘presidente claramente não entende qual é seu papel, especialmente quando não consegue dominar os pensamentos que, talvez, lhe venham à mente’. A grita bolsonariana vai ser geral depois disso.
Mas este é só o começo. Diz que o esforço de comentaristas para dar sentido às destrambelhadas manifestações de Bolsonaro, como sendo algo estratégico ou fizessem parte de um plano nacional de comunicação, é comovente. E tarefa inglória.
O editorial massacra o personagem desde o ‘grotesco discurso de posse, atulhado de arroubos e bravatas ginasianas’, que demonstra que ele nunca foi talhado para ocupar o cargo de chefe de Estado, já que não sabe medir palavras ou gestos. Ao contrário, diz o texto, seu comportamento grotesco e indecoroso faz perceber que ele se considera acima do cargo que ocupa, dispensando-se dos rituais e protocolos ‘próprios de tão alta função’.
E crava o esperado: a disseminação de pornografia pelas redes sociais é uma tarefa que ele se encarregou, ‘para estupefação nacional e internacional’.
Para o Estadão, a única estratégia possível é deixar o País apreensivo a cada novo tuíte ou discurso, ‘pois nunca se sabe o que virá’. O jornal afirma que o personagem foi eleito e, na sua concepção, isso o libera para dizer o que lhe vem á cabeça, sem se importar com a onda de estragos vindas na esteira. E daí seus assessores que se virem para tentar reduzir os prejuízos.
Mas, e o mais não ajuda Bolsonaro, há casos em que nem mesmo o mais habilidoso ministro é capaz de remendar. E cita o discurso de ontem feito no Corpo de Fuzileiros Navais do Rio quando ele disse, com todas as letras, que ‘democracia e liberdade só existem quando as Forças Armadas assim o querem’. É textual. Segundo o jornal, será preciso um grande malabarismo retórico para tirar a pecha de um pensamento irremediavelmente autoritário, ‘de quem acredita que a democracia é apenas um favor dos militares aos civis’. E se conclui que, para o presidente da República, ‘a democracia e a liberdade seriam meramente circunstanciais’, pois dependeriam dos humores dos quartéis.
E o golpe de misericórdia do Estadão, quando diz que um país vai mal quando seu presidente não entende qual é seu papel, principalmente quando não consegue dominar os pensamentos que, talvez, lhe venham à mente. Diz que Bolsonaro, como chefe de Estado, tem obrigação de saber que todas e qualquer uma de suas palavras, nortearão o debate político nacional, seja no Congresso ou nas ruas, e terão consequências no campo da economia. ‘O presidente deve ter consciência de que não é mais candidato, condição que lhe permitia incorporar o personagem histriônico e falastrão que seus fanáticos seguidores apelidaram de “mito”’, diz o texto. E que sua retórica violenta é péssima para agregar apoio político para um governo que começa sem base no Congresso. Pelo menos base visível.
Sua atuação no Carnaval, antagonizando foliões nas redes sociais, divulgando vídeo pornográfico a título de ‘verdade’, não trará votos para os projetos ‘de real interesse do País’.
E finaliza, e aqui vai todo o texto: ‘O bom senso sugere que não se deve esperar que Bolsonaro de repente compreenda seu papel e se transforme num estadista, capaz de, em poucas palavras, guiar as expectativas do País. Diante disso, a ala adulta do governo parece ter decidido trabalhar por conta própria, tentando reparar os danos da comunicação caótica e imprudente de Bolsonaro – desde os prejuízos econômicos causados pelo despropositado antagonismo público do presidente em relação à China e aos países árabes, até a dificuldade de arregimentar apoio a uma reforma da Previdência na qual Bolsonaro parece não acreditar. Pelo que se viu até aqui, todo o esforço que alguns de seus auxiliares estão fazendo para que o presidente desastrado não quebre toda a louça será inútil. Bolsonaro está ficando cada vez mais rápido e certeiro. Em Davos, precisou de seis minutos para mostrar sua incompetência administrativa. Com os fuzileiros navais, não precisou de mais de quatro minutos para revelar sua face autoritária e sua ignorância cívica’.